Estamos num momento de "nervos à flor da pele", tudo vira luta, causa, razão e motivação para buscarmos algo melhor.
Estamos sedentos de justiça, então, cobramos do Juiz Sergio Moro (agora ministro) que seja feita justiça na política. Elegemos um presidente radical e enquanto alguns esperam que ele coloque a casa em ordem, outros temem que seja radical demais e acabe com seus direitos.
Mas isso, falando de sociedade, de coletivo, de bem ou mal geral. No caso da justiça individual, as coisas são mais complicadas, porque uma andorinha só não faz verão, e, quando esta andorinha conta com varas e esferas judiciais para defender seus direitos individualmente, aí sim, a porca torce o rabo!
Quando falamos de justiça e processos no nosso país, a frase mais falada é "a única coisa que dá cadeia de verdade neste país é pensão alimenticia!"
Até famosos são presos por falta de pensão!
Realmente, dá cadeia, no entanto, isso só acontece depois de:
1 - o processo tramitar lentamente na vara de família e o juiz vistar o processo e determinar a citação do requerido
2 - o requerido, após primeiro pronunciamento do juiz, deverá ser identificado e encontrado para que seja notificado. Acontece que, neste caso, é muito comum, que o fulano se esconda o máximo possível, para que o oficial de justiça nunca o encontre e, por consequência, a notificação demore para acontecer, se vier a acontecer
3 - quando a notificação finalmente ocorre, o juiz pede para que sejam apresentados todos os argumentos para a falta de pagamento de pensão ou até mesmo justificativas contrárias ao pagamento da pensão por parte do requerido, e, aí entra-se na fase das petições, que nada mais são do que farpas educadamente trocadas através dos advogados das partes
4 - depois de todas as chances possíveis e imagináveis, o juiz pede ao requerente, através de seu advogado, que apresente os valores devidos com cálculos, juros e correções
5 - Então o juiz determina o pagamento, dentro do prazo de 3 dias, porém, apesar de constar o valor total devido no processo, o requerido só pode ser cobrado dos últimos 3 meses de pensão, então, se hipoteticamente estiver devendo 3 anos de pensão, e, o valor devido for equivalente a 50mil, ele(a) pode depositar somente o equivalente a 3 meses, está tudo certo e cabe ao requerente, tentar num processo paralelo, receber todos os meses anteriores.
6 - não sendo pago o valor, depois de pelo menos 2 meses (chutando baixo) da determinação dos 3 dias, o juiz volta a vistar o processo e decreta a prisão. O Oficial de justiça deve encaminhar ao ministério público, que por sua vez, encaminha ao Conselho de Justiça e isso é enviado ao sistema do CNJ depois de mais alguns meses, para só então a prisão estar efetivamente decretada, e, com isso, lá se foram mais alguns meses e o valor devido já não é mais aquele que consta no processo.
7 - após o decreto da prisão, o requerente pode fazer denúncias no disque denúncia, afim de que a policia vá até a residencia ou trabalho do requerido efetuar a prisão, porém, a preocupação da policia é ir atrás de denúncias de crimes reais, o que não se enquadra na falta de pagamento de pensão, então, a denúncia jamais será de fato apurada via disque denúncia ou qualquer outro meio normal. Na verdade, o requerente fica na expectativa de que o requerido seja parado numa blitz, se envolva em algum incidente de transito ou qualquer episódio no qual seja necessário o envolvimento da polícia, que por sua vez deverá puxar a ficha dos envolvidos e então, por mero acaso, descobrirá que há um mandado de prisão expedido para o requerido, e finalmente a prisão será efetuada.
8 - após efetuada a prisão, o requerido pode ficar 30 dias preso, conforme decretado pelo juiz, mas, se não efetuar o pagamento neste período, após o término dos 30 dias, será posto em liberdade. Então, o requerente deve, através de seu advogado solicitar nova prisão, que poderá ser decretada por mais 60 dias, e, se dentro deste período, o valor não for pago, o requerido é posto em liberdade novamente e, o próximo passo é buscar possíveis bens para que sejam arrolados no processo, mas, se o requerido não possuir bens em seu nome, ACABOU!
9 - O requerido não pode ser preso novamente pela mesma dívida, então, deve-se aguardar mais um mês de débito, para que todo o processo seja reiniciado do zero.
10 - Finalmente, depois de anos de espera, o (a) requerente deve contentar-se em ver no processo digital, a folha do cumprimento do mandado de prisão e a assinatura do alvará de soltura do requerido, que sairá da delegacia sem ter desembolsado um real do valor devido, tendo ficado em cárcere especial, na delegacia e não na prisão, por tratar-se de prisão civil, e, com a sensação de ter cumprido com o que a lei determinou, estando livre para seguir seu caminho, não devendo absolutamente nada a ninguém!
Para o processo, desde o início estima-se 4 anos de espera, luta inglória e um final frustrante.
Atualmente, segundo o IBGE, temos mais de 100 mil processos de cobrança de pensão alimentícia tramitando na justiça.
Entre 2016 e 2017, foram mais de 6256 prisões efetuadas por este motivo.
Esses números são vergonhosos. Todos eles!
O fato é que um dia, você conheceu alguém e se relacionou com este alguém e quando as coisas deixaram de dar certo, decidiram seguir caminhos separados. Acontece que tiveram filhos, logo, em sua grande maioria, estes filhos ficam com a mãe e esta torna-se em algum momento da vida, a tal requerente e seus filhos tornam-se coisas.
Entre os motivos da falta de pagamento, além obviamente da falta de caráter do requerido, está o fato de novas famílias terem sido formadas, então, aquele que deixa de pagar a pensão, constituiu nova família, e, assume que só tem responsabilidade com sua nova família, bem como você e seu atual companheiro (a) devem ser responsáveis pela sua nova família, que inclui, obviamente os filhos que você teve com ele anteriormente. É como se ao se separar, ele (a) deixasse de ser pai ou mãe e passasse a ser pai ou mãe somente dos novos filhos que nascerão de novos relacionamentos.
Enquanto sofre lentamente aguardando a decisão do processo, na esperança de um desfecho justo e positivo, você que entrou com o processo de cobrança de pensão, ouve as pessoas a sua volta dizendo:
- "esquece isso!"
- "deixa esse traste pra lá!"
- "entrega nas mãos de Deus"
- "um dia, quando for mais velho, ele(a) vai procurar os filhos e eles também vão ignorar ele (a)"
- "você criou seus filhos sozinha (o) até aqui! Segue sua vida e se livra desse encosto!"
Falando exclusivamente do lado feminino da história, ou seja, da mãe que precisa criar os filhos, entregar na mão de Deus, esquecer o traste e esperar o futuro chegar, posso dizer seguramente que é tudo uma grande bosta!
Conheci um cara que nunca foi o cara mais correto do mundo, mas que ainda assim, burramente, insisti numa história fadada ao fracasso. Dessa história, foram geradas vidas lindas e iluminadas, que infelizmente, dependem de mim financeiramente, então, quando fiquei desempregada, quem mais sofreu foram as crianças. Os ex-filhos do traste! As coisas que hoje o impedem de ser feliz com sua nova família!
A pensão alimentícia paga por ele, equivalia a 1/5 do meu salário, então, era usado somente para laser das crianças, mas, quando minha condição financeira mudou, a pensão passou a ser 1/2 do que era usado para sobrevivência dos meus filhos. Eles, que sempre andaram de carro, agora andam de onibus ou a pé comigo pra todo lado. Eles, que estudavam em escola particular nível AA, hoje estudam em escola pública de qualidade MENOS Z.
Meus filhos não participam de passeios escolares há mais de 3 anos, não ganham roupas novas há mais de 3 anos, se contentam em usar roupas doadas, sapatos usados e entendem que a mamãe precisa comprar arroz e feijão, então, não ganharão presente de dia das crianças e natal.
Claro que a culpa não é só do cara que deixou de pagar a pensão, é também do momento merda que o país enfrenta, a falta de emprego, salários péssimos e tudo o que está dando errado concomitantemente à falta de pagamento de pensão.
Eu, mãe leoa, não me prendi ao título de secretária bilíngue de diretoria e presidência. De jeito nenhum! Fiz curso de depilação, comecei a trabalhar de manicure, fiz faxina, passei roupa, vendi roupas e bijouterias, aprendi a fazer doces, bolos e salgados pra festas e vendi pão de mel na porta de faculdade. Também aprendi a pedir ajuda, engoli meu orgulho e recebi cestas básicas da igreja, não tive medo da humilhação ou do desdém dos falsos amigos. Pelos meus filhos, não tenho orgulho ou qualquer sentimento parecido. Mas isso não é justo.
Para a atual esposa do ex pai dos meus filhos, sou má, sou o mal encarnado na terra, porque cobrei a pensão, entrei com o processo e fiz o marido dela ser preso.
Para a atual esposa, ela é mãe leoa que cria os filhos "sozinha", que passou pela privação do marido por 30 dias e que segue sua vida dignamente, sem cobrar pensão dos ex maridos, fato do qual ela tem muito orgulho em gritar pra mim em mensagens de whatsapp.
Minha briga não é com a atual esposa, mesmo assim, tive que ouvir termos chulos e palavras de baixíssimo calão, por cobrar algo que é direito dos meus filhos. Não cobrei dela, mas, ela sentiu a dor do marido.
Meu processo é parte dos 100 mil. Meu ex marido é um dos 6 mil presos e nós somos só números.
O fato é que não há processo no mundo que consiga cobrar caráter e correção de alguém. Não há processo no mundo que ensine amor, comprometimento e respeito a quem não faz ideia do que significa isso.
Existem 100 mil requerentes na mesma situação ou em pior situação em que me encontro. Existem 100 mil requeridos de caráter exatamente igual ao do meu ex.
É muito fácil pra quem está de fora, dizer pra esquecer o traste, seguir a vida, esperar o futuro, deixar pra lá. Difícil é colocar tudo isso em prática, fazendo o possível e o impossível pra sobreviver dia após dia, vendo meus filhos crescendo com calças curtas, recebendo doações, sem poder ir ao dentista ou usar os óculos tão necessários. Difícil ver o tempo passar, o mercado se fechar, o espaço diminuir e não ter força nenhuma pra mudar isso.
Recentemente, alguns prazos para cobrança de pensão foram alterados, e, a justiça também criou a guarda compartilhada, o que em tese, faz com que pais e mães tenham os mesmos direitos e deveres, pois se a criança passa seis meses com o pai e seis meses com a mãe, deve ter escola, roupas, conforto e todo o necessário em duas casas, mas são poucos os números praticados na guarda compartilhada, porque além do desinteresse de uma das partes, há o alto índice de violência praticada contra crianças por pais divorciados.
Veja o caso da pequena Isabella Nardoni, que foi assassinada pelo pai e madrasta aos 6 anos de idade. Ela, hoje estaria com 16 anos, mas foi privada de sua vida, por ter sido considerada incomodo na nova vida que o pai constituiu. Após 10 anos de prisão, o pai, assassino, será posto em liberdade e Isabella não está aqui pra perguntar o que fez de tão errado para merecer morrer.
Quando pesquiso sobre pensão alimentícia, também vejo muitos casos de pais que reclamam por ter que pagar, porque entendem que estão dando dinheiro para a mãe, monstra, que gasta o dinheiro como bem entende e tira proveito do pobre pagador.
Acredito que hajam sim casos de mulheres que se aproveitam da situação, mas neste caso, somente tratando-se de casais ricos, pais abastados, que chegam a pagar 15mil de pensão ou mais, para filhos que vivem no luxo, e mulheres que frequentam salões caros e resorts maravilhosos.
No caso da grande maioria, trata-se de pensões com valores entre 200 e 300 reais, que não chegam a pagar o que é gasto com lanche e transporte escolar, mas que ainda assim, apesar de ser um valor baixo, passa a ser essencial para mulheres como eu!
Bom..., escrevi tudo isso porque precisava desabafar e também porque precisava explicar para as outras 100 mil mulheres que pesquisam no google sobre o assunto, tudo o que vi, vivi e aprendi nesse tempo de processo.
Mães, sigam fortes, não desistam de seus filhos, não deixem que eles sintam toda a sua angustia e frustração sobre esse assunto. Se possível, não comentem com seus filhos sobre nada disso, porque além de fazer mal para eles, corre-se o risco de o ex-pai entrar na justiça contra vocês, alegando alienação parental.
Um dia, o traste será esquecido, você terá superado todas as dificuldades, seus filhos estarão criados, a justiça de Deus será feita e o futuro chegará.