segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Diario da Caminhada #dia um

Segundona, acordei as 5 da manhã, como faço todo dia, acordei filho, preparei café pra ele e pro marido, os dois saíram pra trabalho e escola, e eu, finalmente decidi começar a caminhar.

Jake, o golden da minha sobrinha estava me esperando na porta, então, coloquei a guia no monstro e lá fomos nós.

Roteiro: Laguinho / Parque Jacques Cousteau, que é pertinho de casa e cada volta lá equivale a 1300metros, então, além de gostosíssimo e tranquilo, o trajeto é perfeito. 

Tenho 40 anos e peso 66 quilos, minha meta é perder 10 quilos! Vamos lá!

Jake começa bem, mas nos primeiros cinco minutos de caminhada, o monstro se joga no chão e pronto! Levo cerca de uma hora para conseguir concluír a volta e levá-lo devolta pra casa. É compreensível, ele é um monstro de 30 quilos, mas só tem 6 meses de idade...

Enquanto caminho/arrasto Jake, avisto uma pessoa conhecida. Sei quem é. A pessoa sabe quem sou, mas não nos falamos. A pessoa olha pra mim como se estivesse olhando para uma intrusa e me faz sentir um tanto deslocada. Como se eu não devesse estar ali. Me faz sentir mal.

Então me lembrei que ontem, algo bem parecido aconteceu na igreja. Eu e minha filha chegamos um pouco atrasadas, mas ainda nos ritos iniciais da missa e nos sentamos num banco onde só havia uma senhora, que também conheço, mas não converso. 
Acho que ela não sabe que sei quem ela é. 

Enfim, assim que nos sentamos, ela passou a olhar pro nosso lado demonstrando incômodo e isso durou toda a missa. 

Pensei que talvez fosse o perfume, mas não passei perfume! Tomei banho e passei hidratante, aliás, um hidratante bom e caro que minha sobrinha me deu, então, não podia ser o cheiro que a estivesse incomodando. 

Vi que ela olhava insistentemente pra mim e para minha filha e minha primeira reação foi fazer muito carinho na minha pequena, para que ela não percebesse o incomodo da senhora ao lado. A missa acabou e a senhora quase passou por cima da gente para desejar "a paz de cristo" para outra senhora na ponta do banco. Me senti mal de verdade! Achei horrível aquilo!

Deixei Jake em casa e voltei pro laguinho, afinal, mal consegui caminhar!

Mas o pensamento continua, daí me lembrei que essa mesma situação aconteceu comigo na ultima empresa que trabalhei. Na verdade, fiquei seis meses lá, convivendo com os olhares estranhos, até que um dia fui demitida e a justificativa foi: "PERFIL"

Depois de um longo período de desemprego, entrei numa empresa grande e bem bacana. 

Na verdade, todos os dias que ía pra lá, era como se estivesse vivendo a vida de outra pessoa, tinha sempre a sensação de que aquilo era um sonho, e que logo acordaria. 

A empresa estava passando por mudanças estruturais e eu fui uma das mudanças, então, a outra secretária não me recebeu muito bem e saiu de férias, porque eu tinha que passar pela prova de fogo de  estar ali, num lugar onde não era bem vinda e me sair bem. 
Na sequencia, ela foi transferida pra outro braço da empresa e passei mais um mês sozinha, sobrevivendo ao fogo, dando meu melhor, acredito que me saindo bem, até que fosse contratada outra secretária para substituí-la. 
Contrataram então uma moça mais nova que eu mas, como ouvi dizer, ela tinha nível sênior e sabia o que e como fazer as coisas. Realmente me mostrou que sabia. Fez amizade com os diretores, coisas em comum, histórias de filhos, histórias de viagens, afinidade de times e de repente, lá estou eu, super intrusa e deslocada. Claro que ela era competente, mas sabia algo mais que eu não sabia, ela sabia socializar.

Foram seis meses almoçando sozinha, caminhando apressada pra não passar um minuto do horário de bater o cartão, torcendo pra dar cinco da tarde e me sentindo culpada por sair as cinco da tarde, quando ela, sempre super atarefada, saia dez da noite. Seis meses convivendo com as mesmas pessoas e recebendo os mesmos olhares de estranhamento. Foi bizarro!

Ela tinha filhos pequenos, mas dizia que era mais feliz lá no trabalho, do que perto dos filhos, que estavam melhor com a babá, enquanto eu, passava o dia preocupada com os meus, já grandinhos, mas carentes e sentindo minha falta de maneira horrível. O meu mais velho estava fazendo terapia e a mais nova passava o dia me ligando, por tudo o que acontecia ao seu redor.

Passei a ser boicotada por mim mesma. Me sentia mal quando estava lá e isso começou a se transformar em dor física. Dor de cabeça, dor de garganta, cólicas horríveis e suspeita de apendicite. Me sentia tão mal por dentro que comecei a externar isso. Minha infelicidade virou dor e eu virei minha inimiga.

A verdade é que eu só sentia prazer de ir pra lá, quando o presidente da empresa vinha dos EUA. Não sei explicar, mas ele me fazia sentir bem vinda! Sorria pra mim, dava bom dia, perguntava se eu estava bem. 

Porém, houve um momento em que decidi sair da empresa e mandei um e-mail pro presidente pra agradecer e elogiar, mas, avisando que pediria demissão no dia seguinte. Sentia que não podia sair de lá sem dizer pra ele o quanto o admirava!

Então, no dia seguinte, quando cheguei, ele me chamou pra conversar. Era como se falar comigo fosse a primeira prioridade da agenda dele. Achei aquilo excepcional! O cara é presidente da empresa, mora fora do Brasil, administra uma série de assuntos importantes durante o dia e parou pra falar comigo. Me ouviu! Me pediu pra ficar! Passei a admirar ainda mais!

Claro que um mês depois, o superintendente de RH e a nova secretária traçaram um perfil e viram que meu perfil não se encaixava no que a empresa precisava. Também não me encaixei no ego de ambos. 

Parei de pensar um pouco naquilo, voltei minha atenção pro laguinho, caminhei por mais um instante e percebi que não sentia mais minhas pernas, minhas mãos estavam inchadas e meus passos já não estavam tão convictos.


Decidi encerrar a caminhada antes que pudesse despencar no trajeto, e, nesse momento, me peguei me questionando para onde estava indo, qual era a lógica de caminhar envolta do laguinho, dando voltas e mais voltas num mesmo caminho. 

Pra perder peso, claro, mas me pareceu tão sem sentido!

Qual era a lógica de me dirigir seis meses para um lugar onde eu era uma estranha?

Porque sou uma estranha?...

Cheguei em casa, tomei um banho e decidi colocar meu pensamento de hoje aqui, porque sinto que aqui é o único lugar que não sou intrusa ou deslocada. Aqui, sinto como se o presidente da empresa olhasse pra mim, abrisse aquele sorriso tão reconfortante e me desse bom dia!

Aqui o meu perfil é o perfil certo.


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