segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Carta ao Digníssimo


São Paulo, 26 de maio de 2008.


Ao
Sr. Digníssimo Responsável Por Nossa Cidade

Ref.: Solicitação de Sugestão

Prezado Senhor;

Primeiramente, sinto-me no dever de dizer que me tornei admiradora do seu trabalho, sua coragem e de seu empenho em realizar inúmeras modificações em nossa cidade, entre elas, a reabertura de duas estações de trens em bairros com moradores menos favorecidos, que certamente tornarão a subtrair os componentes das linhas de trens, como o cobre, por exemplo, para vender.

Aproveito ainda, para agradecer seu comparecimento na inauguração das novas estações de trens e ainda, para convidá-lo a novamente fazer tal trajeto, já que no momento de sua aparição, eu e outros milhões de usuários não estávamos presentes para dividir contigo tal alegria.
Assim sendo, o ideal é que sua nova aparição seja em dia útil, por volta de 17h00, para que possamos juntos, aguardar a passagem de no mínimo cinco trens, até que consigamos entrar em um não tão lotado, ou com espaço suficiente para nos apertarmos com os outros milhões de seres que lá estarão. Tenho absoluta certeza de que será um evento memorável!

Neste momento, e sem mais delongas, dirijo-me à sua preciosa atenção, para pedir-lhe um conselho, pois creio que o senhor, tendo chegado à posição em que ocupa atualmente, seja a pessoa ideal para me auxiliar a resolver meu impasse.

Não sei se é de seu conhecimento, mas vivemos numa cidade em que o transito tem se tornado insuportável e os transportes coletivos, verdadeiros tormentos para nós, simples mortais, então, hoje, após ser pela milésima vez esmagada, violentada, quase violada, com o sapato arrancado, a bolsa rasgada e o vestido levantado dentro do trem, decidi que realmente, tenho que apelar para alguém que talvez consiga me dar novas sugestões sobre formas de transportes e/ou meios para que eu consiga fazer meus trajetos de maneira no mínimo humana.

Coloco a seguir as opções que tenho atualmente, para evitarmos sugestões inviáveis ok?!

1 – Carro:
Tenho um carro 1.0, que é bastante econômico, sem luxo, sem ar, sem direção, um carro simples mesmo, mas ótimo para o meu padrão de vida. Para encher o tanque de combustível, gasto R$100,00 e um tanque dá para duas semanas de trabalho, pois o trajeto é curto, sem transito, são somente 20 minutos.
A região aonde trabalho tem um custo muito alto, então, a diária de estacionamento no prédio custa R$45,00 e não há vaga para mensalistas. Nos arredores o custo é de R$18,00 a diária e R$180,00 para mensalistas, o mais barato. Não me arrisco deixar o carro na rua, pois mesmo tendo seguro, não sei se posso confiar na ação dos policiais, sempre muito prestativos e ainda, se vou encontrar meu carro nas mesmas condições em que deixei.
Fazendo uma conta rápida, meu gasto mensal, para trabalhar de carro seria de R$380,00, sem contar gastos com desgaste normal do veículo, troca de óleo e demais componentes.
Seria ótimo, SE eu realmente conseguisse fazer o percurso do trabalho em 20 minutos. Acontece que, infelizmente, já fiz o teste e são DUAS HORAS para fazer esse mínimo percurso.
São duas horas cozinhando dentro do meu carrinho 1.0, super confortável, porém, contribuindo para a emissão de poluentes e para a falta de qualidade de vida, já que são duas horas em que o único exercício que faço é mudar a marcha de primeira para segunda enquanto em minha mente, passam coisas que não posso aqui mencionar.



2 – Ônibus:
Com a integração dos transportes coletivos, muitas linhas de ônibus foram alteradas, assim sendo, meu bairro conta hoje com linhas alternativas, que percorrem diversos bairros vizinhos, aonde há um grande número de moradores. Quando o transporte finalmente, após no mínimo 30 minutos de espera, passa pelo meu bairro, encontra-se lotado. O valor da passagem é R$2,40, então, por dia, eu gastaria R$4,80 para permanecer as mesmas duas horas parada no transito, só que sem conforto algum, de pé, respirando o mesmo ar que no mínimo outras 50 pessoas estarão respirando.
Mais uma vez, façamos a conta rápida. São R$115,24 (24 dias úteis) para ficar duas horas parada no transito, em pé, sendo apalpada, encoxada, desrespeitada e moralmente agredida.

3 – Trem
Este tem sido meu atual meio de transporte.
Por uma série de razões, já mencionadas, entre outras, optei por utilizar os serviços da CPTM. São R$4,80 por dia e 20 minutos de percurso. Os trens contam com ar condicionado e som ambiente.
Ótimo não é mesmo?! Não! Não é mesmo!!!
Exatamente em função da abertura das novas estações, integração do transporte coletivo e transito impraticável, os trens são superlotados, o ar condicionado não suporta tanta gente e o som ambiente deixou de ser ambiente faz tempo, muitas vezes, ultrapassando o limite máximo do suportável. São 20 minutos de horror.
Sabe aquela lei da física que diz “dois corpos não ocupam o mesmo espaço”?! Então, diariamente, durante esses 20 minutos, as pessoas que utilizam o trem, tentam modificar tal lei, e, honestamente sinto que estão prestes a conseguir tal feito! Outro dia, uma moça desmaiou e continuou em pé! Consegue imaginar?!

Assim sendo, já que não tenho conseguido pensar em outros meios de transporte, venho tentando usar minha criatividade e pensei em duas alternativas que talvez o senhor possa utilizar como meta para sua próxima campanha.

A primeira é simples, economicamente e ecologicamente correta! É só transformar aquela marginalzinha que fica entre a linha do trem e o rio pinheiros em uma ciclovia!
As pessoas poderiam percorrer a marginal de bicicleta, fariam exercício físico, manteriam a boa forma, economizariam dinheiro e ainda, ajudariam a diminuir a poluição da cidade. Tal medida também seria ótima para empresas como Caloi e a Monark, que como conseqüência, conseguiriam  reestabelecer-se no mercado, passariam a produzir mais e conseqüentemente, passariam a contratar mais funcionários! Seria fantástico! O único porém, é que as empresas necessitariam contar com estrutura para que os funcionários pudessem tomar banho e trocar de roupas ao chegar  e obviamente, o policiamento da ciclovia teria que ser rigorosíssimo. Mas isso não seria difícil para o senhor, seria?!

A segunda opção, é um pouco mais custosa, mas não deixa de ser uma idéia! A criação de uma nova forma de transportes coletivos!
Helicópteros Coletivos!!!
Imagine o sucesso que o senhor faria!
Já que não há mais espaço para carros e ônibus nas ruas, já que o trem é um horror e ultimamente, não temos muitas opções então utilizemos o espaço aéreo para nos locomovermos!
Eu, particularmente, já pensei em comprar um helicóptero, mas infelizmente, meu pequeno salário mal dá pra pagar a parcela do meu carro, então, creio que a parcela de um helicóptero pesaria muito no meu orçamento, além da necessidade da contratação de um piloto, heliponto, enfim, medida individual inviável, mas como meio de transporte coletivo, seria ótimo!

Bem, Sr. Digníssimo Responsável, minha carta acabou ficando um pouco mais longa do que imaginei, mas continuo ainda com a mesma questão em mãos! O senhor tem alguma sugestão adicional para que eu possa chegar até meu trabalho e retornar à minha residência com um pouco mais de tranqüilidade e civilidade?!

Sendo só para o momento, agradeço imensamente por sua atenção e aguardo retorno!

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